quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Ervas Daninhas (Les Herbes Folles), de Alain Resnais (França/Itália, 2009)


Um Resnais mais jovem?

Eis que assisti ao novo filme de Alain Resnais. É um filme curioso, sem dúvida, muito diferente de Ano Passado em Marienbad (1961) e Hiroshima Mon Amour (1959). Neste ponto, Ervas Daninhas é um filme muito mais “jovem”, de um cineasta muito mais velho. A questão que fica é: isso é bom? Resnais faz parte de um raro time de cineastas que, ao que consta, não fizeram filmes ruins (Andrei Tarkovsky também entra aqui). Logicamente, fizeram filmes melhores e piores, mas não ruins. Deixo isso para uma discussão mais aprofundada numa outra oportunidade. Voltando a Ervas Daninhas. Entendamos o título para entender o filme – ao menos, na minha perspectiva. Erva daninha é aquela planta que cresce em lugar indesejado, mesmo que o jardineiro tente cortá-la, ela (re)nasce. Pois bem, assim é o relacionamento de Georges Palet (André Dussollier) e Marguerite Muir (Sabine Azéma). E, mais do que isso, é aquela planta que nasce dentre outras. O relacionamento Palet/Muir nasce entre as relações (esquisitíssimas) de Palet com sua esposa e de Muir com sua amiga. O filme, portanto, sugeriria que a gênese de uma relação social pode ser de origem indesejada e que, talvez, isso fosse bom. O ponto que fica é: se na jardinagem a erva daninha é indesejada, porque não seria no cinema? O problema de uma relação que surja de modo indesejado é que ela tem uma aparência “antinatural”, exatamente o que o filme deixou transparecer: uma juventude “antinatural” de um cineasta experiente que filmou uma história de aparência “antinatural”. E daí, alguém me diria: “Por que o “antinatural’ não pode ser naturalizado?”. Eu responderia: “Pode sê-lo, mas não deixaria de ser anti-natural”. Em suma: Resnais pode mais.

Cotação: ***½ (3,5/5)


Léo.

sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

Coco Antes de Chanel (Coco Avant Chanel), de Anne Fontaine (França, 2009)


Um novo tipo de cinebiografia

Na minha visão, cinebiografias são filmes perigosos. Não bastando o poder – inconsciente, para alguns – da própria imagem, as biografias tendem a idealizar o biografado, que, via de regra, tem um poder de superação sobre-humano. Pois bem, o caso de Coco Antes de Chanel não é bem esse. O filme retrata uma mulher (quase) “absurda” – e aqui lembrando Camus. Não o é totalmente porque lhe falta paixão. E essa falta de paixão perpassa por todos os domínios da vida da mesma, inclusive o da moda, e, aliás, é assustador que alguém seja tão desapaixonada na época mais idealista da vida, a juventude. O filme me passou a impressão de que Chanel só fez moda porque foi o que lhe restou, tanto é que preferia cantar. Alguém poderia me retorquir, afirmando que ela se apaixonou pelo (nem tão) nobre cavalheiro inglês. Eu responderia que não foi uma paixão que convenceu. Mas, eis o problema: Chanel não era nada carismática e a atriz que a interpreta, Audrey Tautou, é uma figura que varia entre a “sem graça” [(O Fabuloso Destino de Amélie Poulain (2001)] e a “gracinha” [(O Código Da Vinci (2006)]. O filme tem o mérito, portanto, de fugir do lugar comum. E isso não significa que foi bem sucedido.

Cotação: *** (3/5)


Léo.

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Contos do Dia das Bruxas (Trick ‘r Treat), de Michael Dougherty (Canadá/EUA, 2008)


Clássicos revisitados

É curioso – e ao mesmo tempo desanimador – como o terror hollywoodiano vem se tornando cada vez menos original nos últimos anos. Sobram fórmulas prontas e faltam ideias inovadoras. Os remakes são produzidos aos montes – algumas vezes até competentes, mas longe dos originais – e as sequências são abusadas à exaustão – vide Jogos Mortais. Nesse sentido, o filme de estréia de Michael Dougherty – que rodou festivais do gênero, mas acabou lançado direto em DVD – não pode ser visto com um grande lance de originalidade. No entanto, a apropriação que o diretor faz de elementos clássicos do terror deve ser levada em conta. Dougherty nos apresenta quatro histórias relacionadas que ocorrem numa noite de Halloween numa pequena cidade do interior de Ohio. O filme se apropria de elementos clássicos do terror, psicopatas, mortos-vivos, vampiros, lobisomens são inseridos no contexto da tradicional festa do Dia das Bruxas. Esse ambiente é muito bem composto pelo diretor, a típica cidade pequena dos EUA, com suas ruas desertas e sombrias, Jacks o’lantern e uma típica festa de rua. A construção dos personagens também representa os tipos comuns, patricinhas, nerds, moças recatadas, diretores de escola certinhos entre outros. O que poderia resultar numa sequência de clichês e mais do mesmo, Dougherty consegue condensar de forma interessante, ligando com habilidade as quatro histórias e criando um personagem inventivo, que pode ser visto como um “espírito do Halloween”. Destaque principalmente para a história do diretor de escola primária e psicopata nas horas vagas, personagem de Dylan Baker – quem mais poderia ser?. As referências do terrir de Sam Raimi e sua trilogia Uma Noite Alucinante ficam evidentes no episódio final. Ainda há momentos geniais, como a sequência do flashback do acidente do ônibus escolar. A estreia de Dougherty na direção pode ser considerada competente e animadora, mesmo se apropriando de uma temática tradicional do gênero, a boa estruturação do roteiro e uma execução acima da média garantem a esperança de bons trabalhos do diretor.


Cotação: ***½ (3,5/5)


Zé.

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Guerra ao Terror (The Hurt Locker), de Kathryn Bigelow (EUA, 2008)


O mesmo Iraque, sob nova ótica

Desde que os EUA invadiram o Iraque, em 2003, Hollywood produziu diversos filmes com a temática da guerra e do terrorismo. No entanto, não se focava nos combates em si, no dia-a-dia dos soldados, nas missões; eram mostrados os bastidores ou cidadãos comuns que tiveram suas vidas alteradas pelos conflitos. Esse é, sem dúvida, o primeiro mérito de Kathyn Bigelow. A partir do ótimo roteiro de Mark Boal, a diretora nos mostra a vida dos soldados sem os clichês, a visão manipuladora ou a típica forçação de barra anti-Bush de outros filmes. Mas esse não é o único ponto positivo do filme de Bigelow. Apesar do título genérico em português – as distribuidoras nunca vão acertar isso, impressionante –, a trama foca em uma equipe que trabalha no desarmamento de bombas no Iraque, o sargento Thompson (Guy Pierce), especialista morre ao tentar desarmar uma, sendo substituído pelo protagonista, sargento James, em atuação excelente de Jeremy Renner. James é viciado em adrenalina, parece apreciar as situações de extremo risco e buscá-las, sendo irresponsável em diversos momentos e colocando em risco a vida de sua própria equipe – o sargento Sanborn (Anthony Mackie) e o especialista Eldridge (Brian Geraghty). Bigelow apresenta um retrato profundo dos personagens, mostrando-nos como cada um encara a guerra e as consequências de seus atos para o grupo. A direção é ao mesmo tempo segura e extremamente competente. Com a câmera na mão, Bigelow consegue captar cada situação de maneira muito eficiente – como nos dois brilhantes usos que faz da câmera lenta – e, aliada ao bom elenco, traz a dor e o desespero de seus personagens, contando os dias para a volta para casa. O que mais encanta é o personagem de Renner. O sargento James mostra um outro lado, o oposto do que se poderia pensar de um soldado num conflito controverso como é o do Iraque. Cotado para diversas indicações ao Oscar e prováveis vitórias, o filme faz por merecer – ainda mais levando em conta que é produção independente –, especialmente sua diretora e o protagonista. Não vi Redacted (2007), o elogiadíssimo retrato da guerra do Iraque de Brian De Palma, mas até agora, Guerra ao Terror parece a obra definitiva de um conflito que parece ter potencial para render muito mais nos cinemas.

PS: a grande pena fica por conta das distribuidoras brasileiras (sempre elas), que não deram a atenção merecida ao filme, lançando-o somente em DVD, antes mesmo do lançamento nos EUA. Se as indicações ao Oscar se confirmarem, fica a torcida para um lançamento nos cinemas.

Cotação: ****½ (4,5/5)


Zé.

sábado, 19 de dezembro de 2009

Abraços Partidos (Los Abrazos Rotos), de Pedro Almodóvar (Espanha, 2009)



Cinema partido

Acho que é sempre difícil falar sobre qualquer filme do Almodóvar, porque não é sempre que temos certeza que nós compreendemos o filme. Assim, o que nos resta é simplesmente dizer o que achamos do filme. O primeiro ponto, que é clichê, é assinalar o total entendimento entre Almodóvar e Penélope Cruz. Se o filme não é dos melhores que ele já filmou, é mais um bom filme para o currículo de Cruz. Alguns assinalaram que o filme foi uma tentativa de Almodóvar de abordar os homens (coisa que ele tão bem fez com as mulheres). Se a intenção foi “esclarecer” a personalidade de Mateo Blanco/Harry Caine (Lluís Homar), ele fracassou miseravelmente. Se a intenção foi apenas a de “expressão” do conflito desse homem preso a dois personagens, a coisa parece mais promissora. Não porque ele tenha um “ataque de nervos”, como as mulheres almodovarianas, mas justamente porque ele os tem em perfeito estado. Exemplo disso foi a tranquila (para não dizer fria) passagem de Blanco para Caine. O “homem almodovariano” é um macho em termos clássicos, daqueles tipos espanhóis - me lembro do personagem de Antonio Banderas em Ata-me (1990) e me parece que essa noção continua correta. Bom, eu não posso deixar de voltar a comentar sobre a personagem de Cruz, Lena. Uma coisa que me chama muito a atenção nos filmes de Almodóvar é a idéia de família que grande parte deles traz. E aqui, novamente, esse ponto é abordado pelo diretor, ainda que de forma rápida e superficial, mas de um modo útil para a construção do enredo. O diretor disse que o filme é sobre “olhar e ser olhado, sobre a intimidade devassada pela câmera”. Tema muito atual. Neste ponto, eu estaria pronto para dizer que o filme peca. Peca porque não é um fato “natural”. O tal Ray X (Rubén Ochandiano) filma os bastidores do filme, mas não tanto por paixão pela imagem (que ele alega ter), mas por ordens paternas. A imagem aparece, em várias partes do filme, como uma espécie de tentativa de controle, dominadora. Assinalaria dois pontos: a própria filmagem do moço e má edição propositalmente feita pela agente de Blanco. Além desses, há o momento em que a personagem de Cruz declara seu ódio por Martel (José Luis Gómez) na câmera. Talvez a melhor idéia fosse o “olhar e a revolta em ser olhado”. E, seja lá como for, o cinema, caros, não é isso.


Cotação: *** (3/5)


Léo.

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Finalmente, ou nem tanto...

A ideia deve ter surgido há uns dois anos, pelo menos da minha parte. Fazer um blog de cinema. Bom, acabou não indo pra frente até convidar o Léo pra finalmente escrever, há mais ou menos um mês, via MSN. E no final das contas, acabou rolando até mais rápido do se esperava.

O título é ao mesmo tempo uma homenagem/citação/firulaporquequeríamosalgoemfrancês relativa ao tema, cinema. Desde críticas de filmes novos e antigos até listas de melhores/piores, passando por ensaios, comentários, opiniões sobre o assunto. Outros tópicos podem entrar aqui, dependendo da relevância ou da relação com o principal - ou ainda da nossa simples vontade de mudar de assunto.

Enfim, sem muitas pretensões, queremos ver mesmo até onde isso vai - se é que vai a algum lugar. E esperamos que vocês, leitores, gostem. Ou não...

Zé.